Cinco pessoas morrem por dia nas estradas e vias urbanas do Estado

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O trânsito catarinense matou cinco pessoas por dia, em média, nos primeiros oito meses de 2016. O dado faz parte de um levantamento feito pelo Instituto Geral de Perícias (IGP) a pedido do Diário Catarinense. No período, foram realizadas 1.193 autópsias de pessoas que perderam a vida em função de lesões decorrentes de acidentes, incluindo motoristas, pedestres e ciclistas.

Ainda de acordo com o IGP, não foi possível fazer uma comparação com o mesmo período de 2015, já que o sistema do órgão passou por um processo de automatização apenas nesse ano. Com isso, a apuração de 2015 demoraria a ser feita, pois teria de ocorrer de forma manual. Para o diretor do Instituto Médico Legal (IML), Rodinei Tenório, as mortes no trânsito são uma epidemia não apenas em Santa Catarina, mas em todo país. Ele acredita ser necessária a criação de uma forte campanha de conscientização dos motoristas, em especial sobre os perigos da direção sob o efeito de álcool e drogas.

— Os acidentes são, de longe, a principal causa de mortes violentas em Santa Catarina. Superam homicídios e quaisquer outros tipos de crime. Há cidades, como Blumenau, onde 80% das mortes não naturais são causadas pelo trânsito. É um problema de saúde pública— afirma Tenório.

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Mais mortes que a média nacional

Outro dado que confirma o alto grau de letalidade das estradas e ruas catarinenses é o número de seguros pagos por morte. Em 2015, o sistema DPVAT indenizou 1.797 famílias que perderam entes queridos no trânsito no Estado. A média foi de 4,92 indenizações/dia. Apesar de alto, o número vem caindo na comparação com os anos anteriores. Em 2014, foram 2.031 indenizações em SC, enquanto em 2013 esse número chegou a 2.197. O dado mais alto ocorreu em 2012, com 2.797 famílias ressarcidas.

Vale ressaltar que o número de indenizações não necessariamente reflete a quantidade de mortes ocorridas em determinado ano. Isso acontece pois os familiares têm até três anos após o falecimento para pedir o seguro, que muitas vezes demora a sair. Também há parentes que não fazem o pedido de ressarcimento.

Mesmo com a queda nos anos recentes, Santa Catarina continua com destaque negativo nacionalmente quando o assunto é a violência no trânsito. A população do nosso estado representa 3,35% do total nacional, porém o percentual das indenizações pagas às famílias de vítimas ficou acima disso nos últimos três anos: 4,22% em 2015, 3,88% em 2014, 4,01% em 2013 e 4,47% em 2012.

Para o coordenador do movimento SOS Estradas, Rodolfo Alberto Rizzotto, algumas hipóteses podem ajudar a explicar esse problema catarinense. Ele lembra que nosso estado possui um índice de motorização por habitante mais alto do que a média nacional, o que contribui para mais acidentes. Além disso, nossas estradas possuem muitos trechos perigosos, como os de Serra na BR-282.

Especialista defende punições mais rigorosas

Assim como o diretor do IML-SC, o carioca Rizzotto alerta para o alto grau de acidentes com vítimas em colisões provocadas por motoristas drogados ou alcoolizados em Santa Catarina. Porém, discorda de Tenório quanto à necessidade de uma campanha. Ele acredita que o melhor caminho para reduzir as mortes é da punição.

— Nenhum país teve grandes resultados investindo apenas em campanhas. É necessário que haja uma punição mais rigorosa. Santa Catarina possui muitos descendentes de alemães e portugueses. Poderiam se espelhar nestes dois povos também na hora de dirigir — afirma.

Ainda sobre a questão da punição, Rizzotto lembra que, apesar do aumento recente, o valor das multas no Brasil ainda está defasado em relação ao que era quando do lançamento do Código de Trânsito Brasileiro, em 1998. Na época, uma multa podia chegar a até 70% do salário mínimo, porém estas ficaram quase 20 anos sem reposição e, hoje, a mesma infração não chega a 25%.

Dor e luto na região Sul

José Eurico de Souza perdeu esposa, filha, cunhada e sogros no mesmo acidente Foto: CAIO MARCELO / Especial

O que era para ser uma noite de festa em família terminou em tragédia em 28 de março. Lisângela Rocha de Souza, 44 anos, a filha Jordana Rocha de Souza, 24, a irmã de Lisângela, Lislei Rocha Santos, 52, e os pais delas, Maria Corrêa Rocha, 76, e Valdemar Rocha, 78, perderam a vida em uma colisão no Sul do Estado. Um Jeep Wangler, que trafegava no sentido Florianópolis – Porto Alegre, avançou para a pista contrária da BR-101 e se chocou contra o carro onde estavam as vítimas.

O acidente chocou a região, e mais ainda a comunidade de Maracajá, cidade de quase sete mil habitantes onde a família residia. Envolvidos em atividades de tradições gaúchas e projetos sociais, a família Rocha deixou saudade por onde passou. Com a perda da esposa e da filha, o corretor de imóveis José Eurico de Souza, hoje afastado do trabalho por problemas de saúde agravados após a tragédia, ainda busca forças para recomeçar. Ao lado do filho Jordhan, 18 anos, eles tentam encontrar na casa silenciosa e vazia motivos para seguir adiante.

— A gente tem um pouco de conhecimento espiritual e é o que está me ajudando, já consegui cartas psicografadas da minha esposa, dizendo que era o destino, que tinha que ser daquela forma. Conforto ainda não consegui, mas tento arranjar forças — lamenta o homem de 52 anos.

Desde a perda da esposa, da filha da cunhados e dos sogros, Rocha tem ficado com a saúde mais frágil a cada dia que passa. Ele se recuperava de um AVC sofrido quando ficou sabendo do acidente. Também sofre de problemas renais, psicológicos, úlcera e pressão alta. Parte dos rendimentos vai para médicos e exames, e até o momento, nenhum valor de indenização foi pago à família.

— A gente esta desamparado, até agora não tivemos nenhum atendimento por parte dos culpados, nenhuma assistência. Não que isso vá me acalentar. Nenhum dinheiro, nenhum valor paga a vida delas. Era tudo na minha vida, e eu perdi — comenta.

O jovem que dirigia o veículo, Victor Bortoncello, 20 anos, foi submetido ao teste do bafômetro no momento do acidente, que não apontou embriaguez. No laudo técnico do Instituto Geral de Perícias (IGP) e no inquérito policial, o carro trafegava entre 85 e 100km/h e não apresentou indícios de problema mecânico. Uma das hipóteses é que o motorista possa ter dormido ao volante. O processo está em andamento e ele irá responder por homicídio culposo, quando não há intenção de matar.

Mãe pede Justiça pela morte de caçula

Já era madrugada do dia 17 de abril quando a adolescente Rafaela Rocha Saraiva (foto abaixo) foi atropelada na marginal da SC-401, no bairro João Paulo, em Florianópolis. Ela caminhava em direção à casa do namorado, que a acompanhava ao lado de alguns amigos. O motorista não parou para prestar socorro. Seguiu no sentido Norte da Ilha, deixando no caminho uma jovem ferida em estado grave.

 Rafaela Rocha Saraiva, de 17 anos, morreu 15 dias depois de ser atropelada em Florianópolis  Foto: Reprodução / Facebook

Rafaela foi internada e ficou 15 dias antes em coma no hospital até falecer no dia 2 de maio. Com apenas 17 anos, a jovem morava em São José com a mãe, a cozinheira Sandra Cardoso Rocha, e trabalhava em uma ótica no Continente Park Shopping. Também estudava, de olho em uma vaga no curso de Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina. A mãe lembra que ela havia passado parte daquela semana de abril dormindo nas casas do pai e do irmão, ambas na Ilha, por estar participando de um curso do trabalho no Shopping Iguatemi.

— Ela não voltou mais. Era uma jovem cheia de planos, tão alegre — diz Sandra.

Antes do acidente, Rafaela e a mãe viviam sozinhas. Depois da morte, a irmã Gabriela, já casada e com filho, voltou para a casa de Sandra, em função do choque da perda da caçula. O enterro da adolescente aconteceu a poucos metros do local do atropelamento, no cemitério do Itacorubi.

Desde então, a família luta por justiça. O atropelador foi identificado como Rodrigo Cremontti Maciel, de 29 anos. Na época do acidente, ele era proprietário de uma loja de cartuchos no bairro dos Ingleses. Após um período de investigação, a delegada Giovana Depizzolatti, da 5ª Delegacia de Polícia da Capital, indiciou em agosto o suspeito pelos crimes de homicídio culposo, lesão corporal, omissão de socorro e evasão do local. O caso ainda vai ser analisado pela Justiça de Florianópolis. Enquanto isso, a mãe de Rafaela pede a prisão do suspeito.

— O que ele fez com a minha família, pode fazer com outro enquanto estiver solto — diz.

(Por Leonardo Gorges – Diário Catarinense)
Foto de Capa: Diorgenes Pandini / Agencia RBS


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