Medo de que poluição volte a afetar o rio Perequê deixa moradores apreensivos em Porto Belo

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O mar estava limpo e a quebrada das ondas fazia tanto barulho que o som das marteladas de um pedreiro mal podia ser ouvido. Muito menos a voz dele quando foi chamar pelo “patrão”, dono de algumas quitinetes que ficam de frente para as águas do Oceano Atlântico em Perequê na, por enquanto, pacata Porto Belo. O patrão é Vilmar Nisz, de 60 anos. Simples, com a barba por fazer e sotaque que por vezes lembrava os descendentes de italianos do Vale do Itajaí, ele fala, com olhar de preocupação, sobre a mancha negra que passou pela foz do rio Perequê no início do ano, afastou turistas — e como consequência uma boa parte da renda que ele imaginava embolsar com as famílias que vêm de outros lugares do Estado e do país.

Vilmar nem consegue calcular o prejuízo que teve, mas as consequências podem ser sentidas para a temporada que bate à porta. Com o dedo indicador manchado de tinta branca por conta da reforma no imóvel, ele mostra o único dos apartamentos que ainda está para ser alugado. Isso nunca aconteceu. Chegar no final de novembro — faltando pouco mais de um mês para bombar o verão nas praias catarinenses — com vagas à disposição era algo que não passava pelos planos. Tudo por conta do medo de que o problema de 10 meses atrás volte a se repetir.

— O pessoal liga para cá, pergunta como está o rio, quer saber se os problemas vão ocorrer novamente. Dá para perceber o receio que eles têm – conta, em tom de lamentação, seu Vilmar.

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Não lembra do que aconteceu? Em 17 de janeiro deste ano, um piloto de ultraleve registrou um rastro preto que ia do rio Perequê e desaguava no mar. Instantes depois banhistas perceberam que peixes estavam morrendo, o que despertou a preocupação de que um novo derramamento de esgoto pudesse ter ocorrido.

Na prática não era o esgoto propriamente dito, mas a poluição teve certa ligação com a mancha que afastou os visitantes, interditou a praia de Perequê e prejudicou diretamente a economia da cidade. Um estudo da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), semanas depois, confirmou a proliferação de microalgas pela mudança na cor do rio. Algas essas que surgiram pelo ambiente estagnado, alta temperatura e luminosidade e, por fim, pela presença de nutrientes inorgânicos. Esse último motivado pelo lançamento de esgoto doméstico, causado pelo crescimento da cidade, o boom de habitantes durante a alta temporada e a falta de saneamento básico.

Comerciantes da cidade mostram preocupação

Um mercadinho é o vizinho de frente de Vilmar. Daqueles de bairro mesmo, com uma boa quantidade de salgadinhos e geladinhos para a criançada que chega com alguns trocados em moeda. A proprietária não estava, mas a funcionária do local — recém-chegada de Sapucaia do Sul, no Rio Grande do Sul — conta que o relato dos moradores desperta desconfiança. Há apenas dois meses em Porto Belo, ela não viveu o problema do começo do ano, mas se preocupa com os comentários da vizinhança.

— Tudo que a gente ouve e o cheiro que a gente sente nos deixam preocupados. Isso que tem ali não é um rio, na minha terra a gente chama de valão (termo pejorativo que resume uma vala de esgoto). Tenho receio, porque se não vierem turistas e ninguém
comprar aqui vou ficar desempregada — relata a moça.

Ao chegar na ponte que corta o rio Perequê e une Porto Belo a Itapema, é possível perceber dois homens jogando tarrafas em direção à água um tanto quanto escura. Um deles é chamado na região de Zé do Frete, e, entre uma entrega ou outra tenta pegar alguns peixes. O outro é o blumenauense Gilberto Larsen, morador da Itoupavazinha, mas frequentador de Perequê há 30 anos. Mesmo sem o pescado – com alguns caranguejos capturados – o representante segue jogando a rede. Tudo para aproveitar uma época do ano em que o rio ainda é parceiro da pesca.

— Venho para cá há décadas. Sei que quando chegar a temporada vai ficar pior, não vai dar peixe, e o que aconteceu no começo de ano vai acontecer novamente — avalia, com pessimismo, o blumenauense.

Ações devem evitar mancha

Segundo a Fundação do Meio Ambiente de Porto Belo (Famap), pelo menos duas ações foram tomadas para evitar que a mancha negra no rio Perequê se repita na temporada 2016/2017. O presidente do órgão, Nelson Ricardo dos Passos, afirma que 40 casas que despejavam esgoto direto no rio tiveram a tubulação cortada e uma ação do município garantiu o monitoramento de onde veio o acúmulo dos dejetos:

— A chance de o problema ocorrer novamente é bem menor.

De acordo com a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Fatma) três dos seis pontos de banho avaliados na cidade etão impróprios: na foz do rio Perequê, na saída do rio Perequezinho para o mar, e no molhe da cidade, ao lado da marina.

(Por Jornal de Santa Catarina)
Foto e Texto: Augusto Ittner / Agência RBS

 
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