Auditoria revela falta de pagamento à prefeitura de R$ 29 milhões em construções de Balneário Camboriú

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Uma auditoria interna realizada pelas secretarias de Planejamento e da Fazenda em Balneário Camboriú revela que irregularidades na aprovação de projetos com aumento de potencial construtivo causaram prejuízo ainda incalculável aos cofres públicos. O levantamento identificou pelo menos 127 obras com dívidas de solo criado. O montante equivale a R$ 29 milhões, dinheiro que as construtoras deixaram de pagar ao município em troca do aumento no volume da obra, principalmente no número de andares.

Em tese, as empresas que constroem estruturas maiores do que prevê a lei municipal deveriam pagar 50% do valor estabelecido no momento da expedição do alvará, e a outra metade 12 meses depois. Nesses casos apurados pela auditoria, os pagamentos não foram feitos. Entre as obras que receberam alvará mesmo sem pagar, muitas já estão prontas.

O DC teve acesso ao relatório por meio da Secretaria de Transparência da prefeitura de Balneário Camboriú. A auditoria resultou em um decreto do prefeito Fabrício Oliveira (PSB), na última sexta-feira, que criou um grupo de trabalho para avaliar as aprovações de projetos no município. O caso também é alvo de inquérito no Ministério Público de Santa Catarina.

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A investigação interna foi feita pela Secretaria de Controle Governamental entre fevereiro e dezembro do ano passado e avaliou documentos desde 2006, quando foi instituída a lei do solo criado. O principal foco, no entanto, foram documentos dos últimos cinco anos. Nem todos os papeis solicitados foram obtidos e a análise foi feita por amostragem, por isso não há estimativa da extensão do dano aos cofres públicos.

O documento ainda revela que as irregularidades são resultado de uma combinação entre negligência e falhas na legislação. Não há, por exemplo, previsão legal para cobrar as dívidas do solo criado das construtoras. Diferente de outras taxas municipais, sobre a outorga onerosa em Balneário Camboriú não incidem juros, multas por atrasos de pagamento e nem inscrição na dívida pública. ¿A situação se agrava quando se parte do princípio que o solo criado é um benefício criado em favor das construtoras, e as mesmas, ainda assim, não se mostram honrosas em cumprir suas dívidas, de modo que o coeficiente adicional deveria ser reduzido, consequentemente o alvará para construção deveria ser cassado¿, alerta a auditoria.

Outras irregularidades são investigadas

O relatório mostra ainda que o município se absteve de cobrar pela renovação dos alvarás de construção, que têm prazo de validade de 60 dias. Por lei, a cada seis meses de prorrogação deveria ser cobrado mais 10% sobre o valor do alvará. No entanto, há construtoras que obtiveram a autorização para construir há mais de 10 anos, iniciaram os trabalhos muito tempo depois — algumas ainda estão com as obras em andamento, ou acabaram de concluí-las — e não pagaram nenhum adicional por isso.

Essa taxa extra é uma maneira legal de a prefeitura controlar a especulação imobiliária, e evitar o aproveitamento de regras menos restritivas por parte das construtoras.

Moratória foi desrespeitada, afirma auditoria

O relatório da auditoria revela que nem mesmo o período que se chamou de ¿moratória da construção civil¿ foi respeitado na Secretaria de Planejamento. Em 2012, um decreto municipal suspendeu apreciação de novos projetos nas áreas onde há mais edifícios até que terminassem as discussões do novo plano diretor, e proibiu temporariamente o uso do solo criado. Essas regras só deixaram de valer em 2015.

No entanto, os auditores encontraram documentos que indicam a aprovação de outorga onerosa também durante esse período. Além disso, há suspeitas de que prédios de luxo tenham conseguido aprovação de solo criado depois que o projeto já havia sido avaliado pela Secretaria de Planejamento, o que é contra a lei. Entre eles estão as torres do Yachthouse, que figuram no ranking nacional como os maiores prédios residenciais do país, com 170 metros de altura. A auditoria diz que a obra recebeu adicional de solo criado de 67 mil metros, ¿aparentemente para regularização¿.

Novas leis para melhor controle

O secretário de Controle Governamental e Transparência Pública, Victor Domingues, diz que teve acesso à auditoria ainda durante a transição de governo, no fim do ano passado. Um dos problemas apontados era o fato de que as cobranças relativas ao solo criado eram feitas pela Secretaria de Planejamento, e não pela Fazenda, que é responsável pela arrecadação.

Segundo ele, a Fazenda já começou a enviar aos devedores os débitos que são passíveis de cobrança.A prefeitura também prepara alterações na legislação municipal, que terão que ser aprovadas pela Câmara de Vereadores. Em especial a regulamentação da cobrança, para que passe a prever multas e punições para o construtor em débito.

Ex-secretário de Planejamento de Balneário em duas gestões anteriores — Edson Piriquito (PMDB) e Rubens Spernau (PSDB), Auri Pavoni diz que há equívocos na auditoria porque a lei que determina o prazo de 60 dias para o início de obras autorizadas, e multas a cada seis meses de atraso, nunca foi aplicada pela prefeitura. Segundo ele, a legislação é antiga, da década de 1970, e não faz mais sentido.

O QUE É SOLO CRIADO?

— Também chamado de outorga onerosa, o solo criado é um instrumento de arrecadação dos municípios que cobra por volume de construção. Nas cidades em que existe o solo criado, há um limite de construção ¿gratuito¿ e outro para o construtor que quiser pagar por uma área extra _ maior número de andares, por exemplo.

— Em Balneário Camboriú, o preço do solo criado depende da região onde está a obra. O dinheiro arrecadado tem que ser aplicado com aprovação do Conselho da Cidade. No entanto, em 10 anos de vigência da lei a aplicação só passou pelos conselheiros quatro vezes, de acordo com a auditoria _ uma em 2008 e outras três em 2013.

 

Por Diário Catarinense
Foto: Agência RBS

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