Doações fantasmas ao PDT entram na mira da Lava-Jato

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A Procuradoria da República vai investigar doações de empresas fantasmas ao PDT, do presidenciável Ciro Gomes. O valor de R$ 500 mil foi recebido pelo presidente do partido, Carlos Lupi, e pelo tesoureiro, Marcelo Panella, em maio de 2010. As cinco doadoras pertencem ao grupo de empresas de fachada criadas pelos empresários Samir e Adir Assad, e aparecem na delação que eles fizeram na Lava-Jato em agosto de 2017.

— A colaboração dos irmãos Assad foi homologada em três locais diferentes: Rio, São Paulo e Curitiba. Com certeza iremos investigar. Só não sabemos ainda quem ficará responsável — disse o procurador Eduardo El Hage.

Outros três casos de doações suspeitas, descobertos na Lava-Jato, também envolvem o PDT. Incluindo os R$ 500 mil atribuídos a fantasmas, as contribuições duvidosas somariam R$ 9,4 milhões entre 2010 e 2014. Ciro Gomes se filiou ao partido em setembro de 2015.

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Lupi e Panella são amigos há mais de 30 anos. Quando um assumiu a presidência do PDT, em 2004, o outro ficou com a tesouraria do partido. Panella é empresário, responsável por lotear uma fazenda de plantação de laranjas herdada do pai. Lupi virou ministro do Trabalho no segundo mandato do governo Lula, e o companheiro chefiou o gabinete.

O empresário Adir Assad promovia shows em São Paulo, até entrar no negócio de fazer caixa dois para grandes empreiteiras do país. O esquema parecia perfeito por envolver apenas firmas privadas. A partir de 2008, Assad criou empresas fantasmas de terraplanagem. Ele colocava apenas uma máquina no canteiro de obras e cobrava por mais de 50.

— Quem vai saber o tamanho do buraco que fiz. A Receita Federal não consegue dimensionar — disse Assad ao juiz Marcelo Bretas, em agosto passado.

Empreiteiras como Andrade Gutierrez, Delta e Carioca Engenharia pagavam a Assad pelo serviço não realizado. Ele retinha comissão de até 20% e devolvia o resto em espécie. Mantinha estrutura de segurança para fazer saques na boca do caixa. A lavagem de dinheiro permitia às construtoras pagar propina a políticos pelo caixa dois sem que os órgãos de fiscalização detectassem. Em depoimento a Bretas, Assad listou as empresas fantasmas que usava.

INQUÉRITO NO STF

Legend Engenheiros Associados, SP Terraplanagem, Power To Tem, JSM Engenharia e Soterra Terraplanagem doaram juntas R$ 500 mil ao PDT no dia 5 de maio de 2010. Foram as primeiras contribuições daquele ano ao partido. Lupi e Panella assinaram o demonstrativo de doação.

— As empresas tinham CNPJ à época. Não é nossa competência examinar anos depois se eram de fachada ou não — afirmou Lupi. — Não há ato ilícito em receber doação oficial e com recibo. Todas as denúncias dos delatores premiados não têm prova. Minha consciência é limpa — acrescentou.

Há outra movimentação suspeita nas contas do partido em 2010. Alvos da Lava-Jato, as distribuidoras de bebidas Leyroz de Caxias e a Praiamar Indústria deram juntas R$ 500 mil ao PDT. Delatores da Odebrecht disseram que a empreiteira usava as duas empresas para ocultar ajuda a políticos. Para tanto, acionava o Grupo Petrópolis, dona da cervejaria Itaipava, que, por sua vez, repassava a tarefa à Leyroz e Praiamar.

A Procuradoria da República considera a triangulação crime de falsidade ideológica eleitoral. O GLOBO obteve os depoimentos de Roberto Lopes, dono das distribuidoras de bebidas, e Walter Faria, proprietário da Itaipava. Lopes diz que, por indicação de Faria, fez o repasse ao PDT e a inúmeros partidos. Faria confirma que a Odebrecht pediu a intermediação do Grupo Petrópolis, mas diz que a operação foi registrada na Justiça Eleitoral, e não deu prejuízo porque descontou os valores do que pagaria à Odebrecht pela construção de fábricas de cerveja.

Panella e Lupi respondem a inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal (STF), que apura peculato (corrupção de servidor público) e lavagem de dinheiro. Em abril, o ministro Edson Fachin mandou o caso à Justiça de São Paulo porque envolve o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega. Delatores da Odebrecht afirmam que Mantega pediu repasse de dinheiro a partidos em troca de tempo na TV para a reeleição de Dilma Rousseff.

O executivo Fernando Reis afirma que despachou R$ 4,4 milhões para o PDT. Diz que acertou o repasse num encontro com Panella na Confeitaria Colombo, no Centro do Rio. A entrega ocorreria em quatro vezes. Um emissário pediria a senha antes de entregar as malas de dinheiro. Torcedores do Fluminense, Panella e Reis teriam combinado as senhas com nomes de ex-jogadores do time: Fred, Conca, Assis e Washington. Em depoimento à PF, Panella disse que pediu apenas doações oficiais e nem foi atendido.

O nome de Lupi também aparece na delação do ex-executivo da J&F Ricardo Saud. Segundo ele, a empresa pagou propina de R$ 4 milhões “na forma de doações oficiais para o diretório nacional”. A acusação ainda dormita no imenso processo da delação de Joesley Batista em tramitação no STF.

— As contas aprovadas do partido são a prova da lisura dos atos. Todas essas acusações não têm sequer uma prova — afirma Lupi.

 

O Globo

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