Levantamento da NSC identifica prováveis perfis robôs seguindo contas de pré-candidatos ao governo de SC

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Criada em abril deste ano e com quase 5 mil seguidores até sexta-feira, uma conta no Twitter, aparentemente de uma mulher da Indonésia, que tem apenas 11 publicações, tem entre a lista de amigos pessoas sul-africanas, norte-americanas, orientais e também um parlamentar catarinense pré-candidato ao governo do Estado. As chances dessa conta, que não interage com outros usuários da rede social, ser um robô (ou bot, na linguagem da computação), é de 94%. Somado a esse perfil, a reportagem da NSC identificou que a média de perfil robôs no Twitter que seguem os nove políticos com intenção de disputar as eleições estaduais deste ano varia entre 15% e 25%.

Os dados, levantados entre 10, 11 e 12 deste mês, foram obtidos a partir de duas ferramentas desenvolvidas para este fim: Twitter Audit e Botometer. A primeira, usada pelo jornal britânico Telegraph nas eleições de 2016 nos EUA, analisa de maneira automática até 5 mil seguidores de uma conta no Twitter e diferencia usuários humanos de usuários automatizados. Já a segunda ferramenta, criada pela Universidade de Indiana, nos EUA, define a partir da base de dados de Twitter a probabilidade de um perfil na rede social ser um robô.

Com a Botometer, foram selecionadas, automaticamente e de modo aleatório, uma amostra de 100 perfis de cada conta. Já a Twitter Audit, analisou um extrato de até 5 mil seguidores por pré-candidato. O Twitter foi escolhido para a pesquisa pois, diferentemente do Facebook, tem o acesso à base de dados (API) aberta para essa finalidade.

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A reportagem se inspirou em um estudo publicado pelo instituto InternetLab, de São Paulo, que analisou e concluiu que cerca de 37% dos perfis no Twitter dos pré-candidatos à Presidência são bot. Para concluir quais perfis têm potencial de ser um robô, essas ferramentas operam a partir de um algoritmo de inteligência artificial e costumam observar determinadas características como interações, tempo e frequência de publicações, assim como seus seguidores e amigos.

 

Preocupação com disseminação de mensagens falsas

Com histórico de denúncias de possíveis interferências nas campanhas eleitorais a partir de perfis falsos e bots, como ocorreu nas eleições para presidente do Brasil em 2014 e nas eleições de 2016 dos Estados Unidos, quando foi identificado que 41% dos seguidores de Hillary Clinton tinham potencial robô, agora, em um cenário político eleitoral, no qual pela primeira vez o pagamento para impulsionar postagens na internet será permitido, a preocupação é com relação a disseminação de mensagens falsas.

Para o especialista em mídias digitais Joel Minusculi, o maior problema é a dificuldade que usuários comuns têm em identificar que perfis são automatizados, já que, na maioria dos casos, os exércitos de robôs são usados para divulgar links e informações para manipular a opinião pública.

— O Twitter é um ambiente focado nisso. Eles podem sabotar informações verdadeiras para propósitos bem ruins. Ou seja, o perigo maior de seguir um robô é não saber que ele é um robô e acabar caindo nas armadilhas twittadas. Além de mentiras, podem  também esconder vírus ou até mesmo só massificar frases, como se fossem perfis “panfleteiros” esperando para alguém pegar a ideia — detalha Minusculi.

O especialista no tema e professor do curso de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP)  Pablo Ortellado ainda pondera que, como ainda não se sabe qual o tamanho deste fenômeno nem o quão decisivo no processo eleitoral ele será, o alerta está nas grandes campanhas usarem esse artifício.

— No Twitter, a principal função (dos bots) é criar trending topics, dando a impressão para outros usuários de que um determinado assunto está sendo discutido por muita gente. Já os perfis falsos, que são mais um fenômeno do Facebook, são normalmente operados por humanos com o intuito de influenciar comunidades em favor de políticos — explica Ortellado.

Em contrapartida, o doutor em Sociologia Política pela UFSC, Jacques Mick, pondera que os perfis robôs identificados pela reportagem, se comparados com os quase 5 milhões de eleitores catarinenses, não chegam a ser preocupantes, pois provavelmente terão alcance restrito e seria preciso analisar a finalidade para a qual foram criados. Por exemplo, mobilizar outros políticos ou capturar informações e mapear perfil de consumidores.

— Uma coisa é o que as candidaturas tentam fazer nas redes, outra coisa é que os usuários fazem delas nas redes. A maior parcela do efeito das redes sobre as campanhas não está sobre o controle direto dos candidatos, ao contrário das outras mídias, como rádio e TV. Os bots (no Twitter) são, nesse momento, pouco relevantes e essa relevância deles no processo eleitoral vai depender do modo como eles eventualmente forem utilizados — conclui Mick.

 

Uso de perfis robôs pode configurar fraude, afirma TRE-SC

O Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (TRE-SC) informa que a legislação eleitoral atual proíbe o anonimato e o uso de perfis automatizados, principalmente se usados para divulgar notícias falsas. De acordo com o juiz Antonio Fernando Schenkel do Amaral e Silva, presidente do Comitê Consultivo da Internet para combate às fake news, esse tipo de prática configura violação à legislação eleitoral. O uso durante a campanha ainda pode ser considerado fraude.

O TRE ainda pondera que, apesar de não ter como mensurar se o compartilhamento de fake news será maior durante o período eleitoral se for impulsionado por robôs, essa prática poderá sim influenciar no resultado de uma eleição, sendo ações como essas podem ser investigadas durante a campanha eleitoral.

SAIBA COM QUEM ESTÁ FALANDO

Comportamentos recorrentes ajudam a identificar a presença de robôs nas redes sociais:

_ O perfil fica “falando sozinho”
_ Não interage com outros perfis
_ Não desenvolve conversas que tenham sentido
_ Alguns robôs só conseguem dar respostas rápidas, nada muito elaborado
_ Vale sempre checar se a pessoa por trás daquele perfil existe em outras redes ou sites oficiais. Se não, a chance de ser fraude aumenta

Fonte: Joel Minusculi, especialista em mídias digitais

Contrapontos

Rogério Portanova (REDE)
A assessoria informou que a conta analisada foi criada recentemente e que o pré-candidato faz uso das redes sociais de forma geral, até por conta do pouco tempo de campanha que o partido terá durante o período eleitoral. Disse ainda que, atualmente, Portanova conta com outras quatro redes sociais, entre elas Facebook, Instagram, YouTube e SoundCloud, mirando uma campanha competitiva. Ainda conforme a assessoria, o pré-candidato percebe que “uma das formas mais intensas e certamente mais econômica” de fazer campanha “é utilizar as redes sociais”.  Por fim, detalhou que o Twitter é considerado “mais uma rede social, pois acreditamos que o Facebook e o Instagram são ferramentas mais populares”.

João Paulo Kleinübing (DEM)
Via assessoria, o deputado informou que, apesar de pouco utilizada, a conta no Twitter é ativa e ressalta que nunca comprou perfis robôs para nenhuma rede social. Ao ser informado sobre o potencial de perfis bots em sua conta e ser questionado se pretendia fazer algo com relação a isso, informou que não, pois tem “absoluta certeza de que não existem perfis robôs” na conta analisada pela reportagem. Por fim, ponderou que, apesar de não usar, acredita que “esse tipo de tecnologia pode deturpar os números reais de informações e acessos, além de tornar a campanha uma corrida desleal” e que acredita em uma “campanha eleitoral limpa e sem ajuda desse tipo de artifício”.

Leonel Camasão (PSOL)
Informou que a conta analisada é ativa e que atualmente interage semanalmente com seus seguidores. Disse ainda que não tinha conhecimento da existência de possíveis robôs em sua conta.

— Sei que isso é um fenômeno cada vez mais comum, que tem muita interação nas redes com robôs. Mas eu não sabia da existência e também não comprei robôs ou seguidores, nem nada parecido — disse.

Acredita ainda que, com base de matérias que leu sobre os candidatos à Presidência, o percentual de seguidores suspeitos de serem robôs identificados na conta analisada é baixo. Por fim, pontuou que desconhece qual o objetivo desses perfis:

— Acho que é um problema essa questão da robotização e da tentativa de manipular a opinião por meio de perfis e seguidores falsos. Isso deve ser desestimulado e ter uma penalidade mais dura. É algo antidemocrático e não pretendemos ter alguma interação com esses robôs.

Gelson Merisio (PSD)
Por meio da assessoria, disse que além do Twitter, mantém ativas outras quatro redes sociais. Questionado se alguma vez comprou de perfis robôs, disse que a equipe “trabalha na direção inversa” e que a orientação é remover qualquer perfil com potencial robô. Afirmou que opera na linha do crescimento orgânico e que “um seguidor real vale cinco, 10, 20 vezes mais que um robô automatizado que não pensa, avalia ou questiona”. Pontuou ainda que tem ciência de que perfis falsos ou robôs são frequentes nas redes sociais e que “muitas dessas contas existem apenas para criticar notícias nossas ou espalhar mentiras” e que a equipe de assessore denuncia contas com essas características quando são identificadas. Por fim, afirmou que é “evidente que perfis falsos podem prejudicar uma campanha com invencionices” e que, por conta disso, está lançando um canal exclusivo para esclarecer boatos e fake news.

Jorginho Mello (PR)
Afirmou não saber da existência de robôs no perfil do Twitter analisado, não faz uso de perfis falsos e que “sempre refutou”. Ponderou que se há algum seguidor desse tipo ainda é algo residual. Detalhou que sempre orienta os responsáveis pela administração das redes para não fazer uso de robôs ou gente de outros países.

— Para mim, e eu levo isso muito a sério, não adianta você ter pessoas que compartilham e curtem de forma falsa, de forma robotizada. É algo frio para enganar. Não aceito isso e o meu pessoal sabe como eu sou exigente quanto a isso. Inclusive tenho reuniões semanais para avaliar como está nosso desempenho. Mesmo assim, sei que muita gente faz de forma mecânica — explicou.

Por fim, explicou que atualmente usa mais o Facebook, mas que ao longo da campanha eleitoral pretende fazer uso de todas as redes sociais que forem consideradas legais, dentro do que a legislação permite.

Mauro Mariani (MDB)
Informou que hoje em dia usa pouco o perfil no Twitter analisado e que não tinha conhecimento sobre as contas com potencial de serem robôs que o seguem. Disse ainda que considera o percentual identificado baixo.

— Eu utilizo muito pouco o Twitter e hoje usamos mais o Whatsapp e o Facebook. Ainda depende da estratégia de comunicação estabelecida pela agência. Agora já é um outro cenário. As minhas coisas sempre foram muito amadoras, mas claro que iniciando o processo eleitoral precisará de um acompanhamento mais profissional disso — antecipou.

Já sobre a disseminação de informações falsas lamentou que, cada vez mais, essa prática deixa as redes sociais sem credibilidade, sem poder significativo, podendo serem descartadas por quem consome esse conteúdo.

— Penso que as redes sociais ainda precisam melhorar muito para terem a capacidade de definir ou de ser decisivo em um processo eleitoral. Ainda penso que o método tradicional de comunicação, como televisão e rádio, ainda vai ser decisivo nessa eleição — concluiu.

Esperidião Amin (PP)
Afirmou que a conta analisada pode ser considerada inativa, já que, desde a virada do ano, quando teve seu telefone roubado e seus dados apropriados por outra pessoa, não entra mais no perfil. Pontuou ainda que deixou de usar o Twitter pois se habituou a trabalhar com o Facebook. Apesar disso, lamentou a existência de perfis robôs e relembrou que já foi vítima de notícias falsas neste ano:

— Potencialmente (os robôs e perfis falsos) são muito prejudiciais. Já tive notícias propagando que eu tenho projetos de lei que eu não tenho. Fiz boletim de ocorrência, mas ainda não houve nenhum resultado. A eficácia foi que a veracidade (das fake news) era tão flagrantemente faltosa que as notícias falsas decaíram — explicou.

Décio Lima (PT)
Informou que não, até então, não tinha conhecimento sobre os perfis robôs que o seguiam no Twitter. Disse que não faz uso direto da conta e que sua assessoria abastece a rede social. Garantiu que nunca comprou seguidores e que também não é favorável à prática.

— Não acredito nisso. Meu Twitter não cresce, está paralisado há muito tempo, não percebo um crescimento dele. Acho estranho pois nunca tive contato com isso (uso de robôs), nunca permiti isso. Nem no Twitter, nem no Facebook, nem no Instagram. Acredito que esses robôs estão ali para me seguir como adversários. Não vejo possibilidade de eles estarem ali para me ajudar — analisou.

Ponderou que isso pode ser um processo preocupante ao longo do período eleitoral deste ano. Acredita que possa existir plataformas e algoritmos com poder não apenas de criar informações falsas, mas de interagir com os usuários onde os perfis emitam mais opinião, e não apenas compartilham notícias.

— Me preocupa algum robô ou algoritmo ter a capacidade de interagir e falar alguma bobagem, emitir uma opinião — disse.

Por fim, pontuou que atualmente utiliza mais o Facebook, conta que está entre as principais entre deputados e senadores. Porém, afirma ter uma política de ação para as redes sociais que deve ser usada algo longo da campanha, fazendo uso de todas as ferramentas disponíveis.

Paulo Bauer (PSDB)
Via assessoria, disse que a conta analisada é ativa e costuma ser usada para prestação de contas e divulgação do mandato do senador e nunca comprou perfis robôs para o perfil. Ressaltou ainda que também nunca fez uso de perfis automatizados, mas que desconfiavam que “havia algo errado em função dos ataques que a conta já sofreu”. Agora, explicou que pretende descobrir quais são os perfis robôs e apurar quais os riscos para o perfil do senador. Além disso, ressalta que deve continuar “falando a verdade para dar transparência ao mandato e combater esse tipo de ataque”.

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