Após quase dois meses de espera, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou nesta quinta-feira (1º) a nomeação do advogado Cristiano Zanin Martins, de 47 anos, para ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF). Zanin, que atua como advogado de defesa do petista desde 2013, se tornou um símbolo marcante no cenário da Operação Lava Jato, experimentando uma reviravolta notável. Enquanto antes enfrentava uma série de derrotas nos processos contra Lula, incluindo a prisão do cliente e sua exclusão das eleições de 2018, nos anos seguintes ele reverteu as condenações e conseguiu o arquivamento de mais de 20 ações e investigações contra o ex-presidente.
Durante todo esse período, Zanin se manteve fiel à mesma linha de defesa, além de contestar minuciosa e persistentemente diversos atos processuais, alegando a inocência do atual presidente e a ausência de provas de seu envolvimento em desvios da Petrobras.
Desde o início, ele questionou a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba para centralizar os casos, obtendo sucesso em 2021, quando o STF acatou sua tese e anulou as condenações de Lula. Além disso, Zanin sempre acusou o ex-juiz e atual senador Sergio Moro (União Brasil-PR) de parcialidade, bem como os procuradores da extinta força-tarefa de perseguirem Lula. Essa tese também foi aceita pelo STF, levando as investigações de volta à estaca zero e, posteriormente, à prescrição.
Até hoje, Zanin sustenta a teoria de que Moro e o ex-procurador e deputado cassado Deltan Dallagol (Podemos-PR) conspiraram com os Estados Unidos para enfraquecer a Petrobras no mercado internacional e impedir o acesso de empreiteiras brasileiras ao exterior. Utilizando mensagens hackeadas entre os dois, ele reforçou a narrativa de conluio entre o juiz e a acusação nos processos da “República de Curitiba”, o que também contribuiu para a desmantelação da maior operação de combate à corrupção já realizada no país.
Enquanto a Lava Jato desfrutou de apoio da imprensa e do público, além de cooperação internacional para obter provas, Zanin também desempenhou um papel ativo na batalha contra a operação. Ele envolveu advogados e juristas renomados fora do Brasil, levando o caso de Lula até a Organização das Nações Unidas (ONU), onde obteve uma decisão favorável ao petista e importou para o país a teoria do “lawfare” – a utilização estratégica do Direito para deslegitimar, prejudicar ou destruir o adversário.
No livro que lançou em 2019 sobre o tema, escrito em parceria com sua esposa e sócia, Valeska Teixeira Martins, e o advogado Rafael Valim, Zanin definiu “lawfare” como o uso estratégico do Direito com fins de prejudicar o inimigo. Além de contra-atacar Moro e Dallagnol, ele também processou dezenas de jornalistas em nome de Lula, que estavam investigando suspeitas de corrupção envolvendo o ex-presidente.
No entanto, além de garantir a absolvição de Lula, Zanin também abriu caminho para que inúmeros outros réus da Lava Jato abandonassem seus processos. Em uma ação apresentada em 2020, ele alegou que os arquivos digitais da Odebrecht, usados pelo Ministério Público Federal (MPF) para comprovar pagamento de propina e caixa 2, poderiam estar adulterados devido à forma obscura como foram transportados da Suíça para o Brasil. Como resultado, o ministro Ricardo Lewandowski, cuja cadeira Zanin ocupará, invalidou os registros como prova e suspendeu investigações contra diversos políticos, incluindo o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), e o ex-presidente da Fiesp Paulo Skaf (MDB), entre outros.
O sucesso de Zanin em desmontar a Lava Jato o tornou uma figura proeminente no cenário político e aumentou ainda mais a confiança de Lula em seu advogado. Esses foram fatores que o colocaram como favorito do presidente para substituir Lewandowski, também indicado por Lula em 2006 e considerado por ele o ministro mais leal ao PT dentre todos os indicados durante os governos do partido. Lula acredita que Zanin é leal e não o “trairá” como outros ministros indicados por ele e pela ex-presidente Dilma Rousseff. Membros do PT ainda se ressentem de ter apoiado as indicações de Luiz Fux e Luís Roberto Barroso, que adotaram uma postura mais liberal na área econômica e foram rigorosos nos escândalos de corrupção envolvendo o partido que chegaram à Corte.
Zanin também conquistou simpatia entre os atuais membros do STF. Gilmar Mendes, o decano e ministro mais influente da Corte, Cármen Lúcia e Barroso já se manifestaram favoravelmente à sua indicação. O ex-ministro Marco Aurélio Mello, que se aposentou recentemente, afirmou: “É um grande nome, dada a vitória que obteve ao ressuscitar o presidente Lula. E não há quebra do princípio da impessoalidade. A escolha é soberana do presidente, que deve indicar um jurista de excelente formação na área do direito e de sua confiança. Não há desvio de finalidade”.
Devido ao seu perfil comprovadamente garantista, espera-se que o nome de Zanin seja aprovado com relativa facilidade no Senado. Apesar disso, nos últimos meses ele enfrentou resistência no mundo político, não apenas dos opositores de Lula na direita, que se sentem incomodados com sua proximidade com o petista, mas também dos apoiadores da Lava Jato, temerosos de que sua entrada no STF aprofunde ainda mais o revés no combate à corrupção.
Lula confirmou a indicação de Zanin para o STF na tarde desta quinta-feira, afirmando que era uma escolha esperada e que acredita que o Brasil se orgulhará do advogado.