Notre Dame: Porque os bilionários deles são mais altruístas do que os nossos?

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Eu aposto: você adoraria ver uma fila de bilionários assinando cheques polpudos de doação para o Museu Nacional assim que viu aquele prédio ser consumido pelo fogo no ano passado.

Os ricaços do mundo inteiro prometeram enviar quase 1 bilhão de dólares à reconstrução da Catedral de Notre Dome. Pra gente restou apenas um dos pecados capitais – o da inveja.

A pergunta que não quer calar é: existe alguma coisa na nossa água que induz os nossos bilionários a serem menos altruístas do que os bilionários dos outros?

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E você sabe essa resposta. Não existe.

Caso contrário, a brasileiríssima Lily Safra não enviaria um cheque de € 20 milhões – o equivalente a R$ 88 milhões – aos responsáveis pela reconstrução de Notre Dame já no primeiro dia após a tragédia.

Os nossos bilionários reagem aos incentivos que possuem. Exatamente como você.

Imagine acessar a conta bancária nesse momento e encontrar uma fila de dígitos indicando que a sua família poderia comprar basicamente qualquer produto à disposição no planeta.

Gente como Lily Safra pode se dar a esse luxo.

Agora imagine você ser a herdeira de um banqueiro e sentar pra conversar com um reitor da UFRJ, fundador de um partido político abertamente anticapitalista, e que chegou a ser acusado pelo Ministério Público Federal de improbidade administrativa por promover um evento político-partidário na instituição, para discutir os rumos do Museu Nacional.

Você não será bem-vinda, tratada como uma expoente da miséria humana. E não apenas isso. Não haverá qualquer transparência no gasto da sua hipotética doação – que poderá atender a basicamente qualquer desejo de um reitor que literalmente recebe um salário maior do que o desembolso médio com a manutenção do museu na última década (o último relatório disponível sobre as demonstrações financeiras da Sociedade dos Amigos do Museu Nacional, uma associação civil reconhecida pela UFRJ, já tem mais de dois anos).

A verdade é que nós não teremos cheques dessa natureza patrocinando a cultura nacional enquanto a cultura nacional permanecer sequestrada pela mentalidade burocrática de feudos políticos anticapitalistas.

Enquanto alimentarmos a fé de que existe uma luta do bem contra o mal – em que o bem representa o altruísmo do Estado brasileiro e o mal a vilania mesquinha da classe produtiva – o envolvimento de gente rica com universidades, museus e bibliotecas permanecerá sendo tratado como uma degeneração da pureza da cultura nacional.

As nossas tragédias, portanto, são ainda piores que as dos outros.

Elas não se contentam em incendiar os nossos prédios públicos: também destroem cada pedacinho de razoabilidade daqueles que se apoderam da materialização da História e da identidade nacional.

 

Via Rodrigo da Silva, editor do Spotniks

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