Um relatório preliminar do Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE) aponta que 110 cidades de Santa Catarina são suspeitas de usar R$ 4,3 milhões de verbas de enfrentamento à pandemia de Covid-19 para outros fins. Segundo o TCE, os recursos enviados pelo governo federal foram usados, por exemplo, para pagar cestas de Natal, construir pontes, pavimentar ruas e comprar café (veja mais abaixo) e não em ações destinadas à saúde e à assistência social.
O documento foi enviado aos integrantes da Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid-19. O TCE afirma que o levantamento é passível de correções e deve ser finalizado até setembro.
O relatório foi feito a pedido do senador Ciro Nogueira (PP), que solicitou aos 27 tribunais de contas estaduais e ao Tribunal de Contas da União (TCU) informações sobre gastos com a pandemia. A solicitação foi feita em abril no contexto da CPI da Covid e resposta foi encaminhada ao Senado Federal em 26 de julho.
Segundo o Ministério Público (MPSC) e TCE, o relatório final sobre dos possíveis gastos deve ser apresentado até setembro. “Somente após o recebimento da versão final que vamos definir a forma de atuação do MP”. O MPSC, informou ainda que o levantamento foi analisado e solicitadas “correções e complementações ao TCE”.
A assessoria do senador Luis Carlos Heinze (PP-RS), que assumiu o lugar de Ciro Nogueira na CPI da Covid, informou que ele irá analisar todos os documentos e se comprovados os desvios, vai apresentar denúncias na CPI da Covid.
O total do valor recebido pelas cidades para a pandemia é R$ 883.409.792,30, com a identificação de de R$ 4.338.655,17 usados em ações fora da finalidade.
Os auditores investigaram como e onde foi aplicado o dinheiro encaminhado pela União ao Estado e municípios por meio da lei complementar nº. 173/2020. A legislação prevê duas fontes de recurso chamadas de 52 e 53. A 52 tem uso exclusivo para gastos com saúde e assistência social. Porém, para a 53 não há uma determinação de aplicação.
Decoração de natal à pavimentação de ruas
No topo da lista dos municípios que apresentaram possível “desvio de finalidade” com o dinheiro enviado pelo Governo Federal aparece a cidade de Santo Amaro da Imperatriz, na Grande Florianópolis, com o montante de R$ 2,6 milhões, e Correia Pinto, na Serra Catarinense, com mais de R$ 1,1 milhão.
Segundo o documento do TCE, a gestão anterior da prefeitura de Santo Amaro da Imperatriz usou a verba 52 para pagar servidores, comprar móveis, plantas, café e pavimentação de ruas.
Por meio de nota, a prefeitura afirmou que inverteu as fontes de recurso na hora de repassar dados ao TCE. Ou seja, que teria utilizado a fonte de recurso 53 e não a 52. Ainda na nota, a gestão alegou que “aplicou os recursos corretamente de acordo com a lei, sendo mais de R$ 330 mil em ações de assistência social e saúde”.
Em Correia Pinto, de acordo com o levantamento preliminar, a prefeitura aplicou o recurso da saúde no custeio da iluminação de Natal, manutenção de veículos da prefeitura e na construção de uma ponte.
Por nota, a antiga gestão municipal negou ter cometido irregularidades. Segundo os antigos gestores, um erro nas informações enviadas ao TCE justifica o ocorrido. Ao invés de computar os gastos citados como 53, que não tinha destinação pré-definida, foi marcado como 52, exclusivo para saúde.
A atual administração municipal informou que assim que soube do conteúdo do levantamento, solicitou informações complementares à equipe contábil. Os técnicos constataram equívoco no envio de informações ao TCE, segundo a prefeitura.
No último boletim divulgado pelo governo estadual, nesta quarta-feira (11), a cidade de Santo Amaro da Imperatriz registrou 3.762 casos confirmados de Covid-19, 15 casos ativos e 74 óbitos. Já o município de Correia Pinto foram 1.845 casos confirmados, 15 ativos e 59 óbitos causados pela Covid-19 desde o começo da pandemia.
Governo estadual também foi verificado
O levantamento do TCE também analisou o dinheiro recebido e gasto pelo governo de Santa Catarina. Ao Estado, o governo federal encaminhou mais de R$ 2,4 bilhões. Contudo no Portal da Transparência, segundo os auditores, o governo detalhou somente o que foi feito com R$ 638 milhões.
De acordo com o TCE, isto comprometeu a transparência na aplicação dos recursos destinados ao combate à pandemia.
Desvios podem configurar crimes de responsabilidade
Para o presidente da comissão de moralidade da Ordem dos Advogados do Brasil (Oab/SC), Rogério Duarte, é necessário uma apuração sobre os fatos.
Segundo o especialista em Direito Público com ênfase em Gestão Pública, Guilherme Moura Cardoso, se constatadas as irregularidades, pode haver caraterização de crimes de responsabilidade.
De acordo com Guilherme, os “desvios de finalidade” ferem a lei dos crimes de responsabilidade, o código penal e o artigo 37 da Constituição, no que trata sobre a administração pública.
G1 SC