Mortes no Ruth – Médicos responsáveis merecem estar presos

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Nos últimos dias, duas mortes foram registradas com fortes suspeitas e grandes indícios de negligência médica por parte dos médicos plantonistas cedidos pela Pró-Ativo Gestão de Saúde, empresa terceirizada que atende o pronto socorro do Hospital Ruth Cardoso.

A empresa, com sede em Curitiba, venceu a licitação 004/2018 que visava a contratação de empresa para prestar serviços médicos de urgência e emergência para o Pronto Socorro do Hospital Municipal Ruth Cardoso. A Pro-Ativo, que presta o serviço desde dezembro de 2018, foi notificada algumas vezes antes da suspensão dos serviços que aconteceu na última semana. Entre os motivos das notificações está desrespeito com paciente, atrasos e até mesmo fornecer o número de profissionais abaixo do que foi contratado, deixando a unidade carente de mão de obra especializada.

Ivonei dos Santos, 24 anos, e Larissa Martins, 31, morreram após terem passado pela emergência do Hospital Ruth Cardoso mais de uma vez, se queixando dos mesmos sintomas e liberados sem que fosse comprovado um diagnóstico. Nas vezes que foram atendidos, questões básicas, porém importantes, foram ignoradas pelos médicos e tratadas com leviandade. Questões estas que, se notadas a tempo, teriam evitado a morte dos dois pacientes que procuraram a unidade de saúde.

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A reportagem do Portal Visse? teve acesso a informações que elucidam e mostram, com muito mais clareza, a imprudência dos profissionais médicos que atenderam estes pacientes.

Caso Ivonei

O jovem Ivonei dos Santos, de 24 anos, deu entrada pela primeira vez no PS do Hospital dia 26 de fevereiro. Ele era portador de uma doença que exigia cuidados especiais e já era atendido pela rede municipal de saúde desde 2017. A doença que acometia Ivonei fazia dele um paciente que merecia atenção redobrada em todo e qualquer atendimento.

No primeiro atendimento do dia 26, o jovem se queixava de dores nas costas que duravam quase uma semana. Feito alguns exames, o exame de sangue apontava uma leve alteração que poderia indicar uma infecção, que foi ignorada pelo médico K. A.. Ivonei foi medicado, apresentou melhora e foi liberado.

No dia 1º de março, o jovem voltou ao PS do Hospital se queixando do aumento das dores e vômitos. Ele foi atendido pelo médico W.H que não pediu nenhum exame. Ivonei foi medicado e novamente liberado.

No dia 2 de março, Ivonei voltou novamente ao PS. A dor que era nas costas espalhou para a barriga. Ele estava com pressão baixa, vômitos, constipação e dificuldade para urinar. Ele foi atendido por outro médico, G.B.V, foi medicado e mais uma vez liberado sem ter feito nenhum exame.

No mesmo dia, Ivonei foi até o Hospital Marieta, em Itajaí. De acordo com a Secretaria de Saúde de Balneário Camboriú, o Hospital Marieta ainda não forneceu o relatório e nem mesmo os dados da situação de Ivonei na hora do atendimento. A reportagem apurou que no Hospital Marieta, ele teria feito uma lavagem intestinal que apresentou sangue, o que caracteriza uma possível infecção, fato que ainda não foi confirmado. A certeza é uma só, ele também foi liberado no Hospital Marieta.

No dia seguinte, dia 3, Ivonei voltou ao pronto socorro em crise. Com pressão alta e febre, o jovem estava fraco, os dedos roxos por falta de circulação sanguínea, barriga inchada e fortes dores nas costas e barriga. Foi então que o médico do pronto socorro, L.P., pediu um exame de sangue que mostrou que os órgãos de Ivonei estavam entrando em falência e havia um quadro de infecção generalizada. Uma tomografia mostrou acumulo de líquido na região do abdomen.

Só ai, depois de uma semana de atendimentos, o médico plantonista do pronto socorro pediu para um infectologista avaliar o caso. Outros exames foram feitos, diversas medidas foram tomadas e as 17 horas Ivonei teve uma parada cardiorrespiratória. Mesmo com todos os esforços, pouco depois das 18 horas, Ivonei dos Santos, com 24 anos, não resistiu e morreu.

Desde o início, os médicos do pronto socorro sabiam das condições iniciais de Ivonei. Todo o histórico do jovem poderia ser consultado, as queixas aumentaram a medida que ele procurava o pronto socorro e, mesmo assim, não foi dada a devida atenção pelos médicos.

Caso Larissa

A entregadora de Camboriú, Larissa Santanna Cavanha Martins de 31 anos, foi mais um caso de negligência protagonizada pelos médicos da empresa contratada para gerenciar o pronto socorro do Hospital Ruth Cardoso.

No dia 09 de fevereiro, Larissa foi encaminhada pelo Hospital de Camboriú ao Ruth Cardoso após ter sofrido uma forte dor de cabeça e apresentar também pressão alta e confusão na fala e raciocínio. Mesmo após ser medicada no hospital de Camboriú, a dor não aliviou e então ela foi levada ao PS do Ruth Cardoso.

De acordo com relatos, Larissa teria sentido um forte “estrondo” e uma súbita dor de cabeça enquanto pilotava sua moto. Com a dor ela perdeu os sentidos e caiu.

Ao dar entrada no PS do Ruth Cardoso, ela foi examinada pelo médico G.S.A, foi solicitada uma tomografia e ela foi medicada com remédios mais fortes do que ministrados no hospital de Camboriú. Com a melhora de Larissa, após a dose das fortes medicações, o médico a liberou sem nem mesmo ver o laudo do resultado da tomografia.

Dois dias depois, no dia 11, Larissa voltou a ser encaminhada pelo Hospital de Camboriú ao PS do Ruth Cardoso. Os medicamentos não estavam fazendo efeito, a situação era mais grave e Larissa estava com uma crise de hipertensão grave, desorientada e não conseguia caminhar pois sentia tonturas. A médica A.P.P, que atendeu a jovem, pediu exames de sangue e mais uma tomografia. Ela foi medicada com fortes analgésicos e algumas horas depois foi liberada por outro médico, I.G.R, que alegou para a mãe da jovem que Larissa não tinha nenhum problema e estaria “fingindo” a dor. Segundo relatos, o médico ainda aconselhou que procurasse “auxílio ambulatorial”, um tratamento fora do hospital, como é o caso da psicologia. Mais uma vez, o médico que liberou Larissa, não checou o laudo do resultado da tomografia.

No dia 28 de fevereiro, 19 dias após o primeiro atendimento, a família de Larissa procurou o Hospital Marieta, em Itajaí, para buscar auxílio médico. De acordo com informações levantadas pela reportagem, Larissa já não conseguia mais falar e estava usando fraldas pois não tinha mais controle sobre o corpo. Ela foi diagnosticada com aneurisma cerebral roto, tentou-se uma cirurgia, mas era tarde demais. Larissa morreu no dia 05 de março, deixando o marido e um filho de 12 anos.

A reportagem descobriu que os exames de tomografia feitos nos dias 09 e 11 de fevereiro, já mostravam que Larissa tinha um aneurisma no cérebro, hidrocefalia (excesso de liquido no cérebro) e um quadro de edema encefálico. Estes resultados, que poderiam ter salvado Larissa, foram ignorados pelos médicos que sequer olharam os laudos dos exames.

Um terceiro caso

Há ainda um terceiro caso, que ainda não foi confirmado, mas que teria sido investigado pelo hospital, em que uma paciente com problemas renais crônicos, que necessitaria de atenção especial, em meio a uma crise, teria sido deixada esperando por quatro horas no corredor, por não ter sido avaliada como um caso grave pela equipe do PS do hospital. A mulher, que não teve o nome revelado, teria sido encontrada pela direção do hospital no corredor, já com a pele acinzentada e apresentando claros indícios de falência nos rins. Ela teria sido atendida naquele momento, mas não resistiu e acabou morrendo horas depois.

Rotatividade

Nos relatos descritos acima, pode notar-se que, nos dois casos, não se repetiram os médicos. A alta rotatividade de profissionais fornecidos pela empresa Pró-ativo, foi uma das queixas relatadas por funcionários do hospital. Há relatos de médicos vindos de outra cidade para cobrir apenas um plantão de 24 horas e não aparecer mais.

Barato saiu caro

A empresa Pro-Ativo foi vencedora da licitação 004/2018 que visava a contratação de empresa para prestar serviços médicos de urgência e emergência para o Pronto Socorro do Hospital Municipal Ruth Cardoso. Ela foi vencedora do certame por apresentar um valor 700 mil reais mais barato que a outra concorrente.

A licitação, iniciada em março de 2018, só teve a vencedora declarada no final de outubro. O processo licitatório, que sofreu diversos recursos, teve duas suspensões durante seu trâmite pedidas pelo TCE e pela própria secretaria de compras do município.

Secretaria de Saúde

Já na semana passada, a secretaria de saúde do município afastou todos os profissionais envolvidos no atendimento dos casos relatados acima. Os serviços prestados pela empresa Pró-Ativo foram suspensos e uma outra equipe foi contratada emergencialmente para o atendimento do pronto socorro.

De acordo com a secretária Andressa Hadad, todos os relatórios, prontuários e exames dos pacientes já foram levantados, estão sendo analisados e serão enviados ao Ministério Público Federal já nesta segunda-feira, dia 11, para que seja aberta uma denúncia crime contra a empresa Pró-Ativo, médicos e profissionais envolvidos nos atendimentos.

O material será encaminhado e serão abertas denúncias junto ao COREM e ao CRM para que sejam avaliadas as condutas médicas e punir os responsáveis, se necessário for. Um boletim de ocorrência e a entrega dos documentos também será registrada na Polícia Civil para que seja aberto um inquérito de um possível homicídio culposo por negligência médica.

“A secretaria de saúde está empenhada para que sejam apuradas todas as irregularidades e que os responsáveis sejam punidos no rigor da lei. Zelamos pela vida e trabalhamos por ela.” destacou a secretária.

 

Nota do Editor
Os nomes dos profissionais foram omitidos até que sejam esclarecidos os fatos. Tão logo exista a confirmação, serão trazidos os nomes em matéria posterior

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